Profissional especialista em psiquiatria da infância e adolescência explica se autor de crime bárbaro pode ser tratado como psicopata, mesmo com apenas 13 anos
Marcelo Gouveia e Matheus Monteiro
“Até segunda prova, doente e não criminoso.” Este é o diagnóstico do psiquiatra da infância e adolescência Marcelo Caixeta sobre o caso do garoto de 13 anos que matou a vizinha, uma adolescente de apenas 14 anos, na última semana, em Goiânia.
Para o especialista, o crime que gerou repercussão nacional e comoção nas redes deve ser tratado como “psiquiátrico” e explica: “Sempre que você procura compreensão para um crime e não encontra resposta, você está diante de um caso psiquiátrico.
“Ele não pode ser psicopata de acordo com critérios de diagnósticos. É uma questão semântica, mas ele pode sim ter alguma alteração, como delírios”, explicou o profissional em breve bate-papo com a reportagem do Jornal Opção. Confira abaixo a entrevista na íntegra:
O senhor acha que o adolescente pode ter alguma alteração psiquiátrica?
Com certeza, trata-se de um crime psiquiátrico. Sempre que você procura compreensão para um crime — o porquê ele matou — e não encontra resposta, você está diante de um fato psiquiátrico.
Em uma primeira análise, qual seria o seu diagnóstico?
Pelo que eu vejo, pressupõe-se que ele sofre de delírio, o que na psiquiatria é muito comum. Imagino que seja um delírio de referência, quando a pessoa acha que todos estão fazendo referência a ela. Ela sai na rua, por exemplo, e acha que estão olhando para ela ou dizendo coisas sobre ela.
O promotor do caso disse à reportagem que o adolescente não pode ser tratado como psicopata. Como psiquiatra, como o senhor vê essa afirmação? É isso mesmo?
Psicopata é um termo que não existe na psiquiatria hoje em dia. O termo hoje é transtorno de personalidade antissocial. E isso só pode ser falado para pacientes acima de 18 anos. Para adolescentes, o termo usado é transtorno de conduta.
Então, ele realmente não pode ser tratado dessa forma?
Ele não pode ser psicopata de acordo com critérios de diagnósticos. É uma questão semântica, mas ele pode sim ter alguma alteração, como delírios. Esses delírios, geralmente, vêm acompanhados de depressão que, sobretudo na adolescência, aumenta a agressividade.
A defesa alegou recentemente à imprensa que foi só depois de algum tempo após o crime que a ficha do adolescente caiu. Isso é possível?
Pode ser manobra jurídica. Mas, em tese, como não analisei o caso com exames — ele pode ter um tumor na cabeça, por exemplo –, o que vejo é que, em geral, é que ele pode apresentar um quadro de depressão com questões flutuantes. Isto é, hoje ele pode estar mais agressivo e amanhã menos. Então, é sim possível que a ficha dele tenha caído depois, como também pode ser possível que ele esteja sendo orientado a responder com arrependimento.
Qual é a orientação do senhor para as duas famílias, tanto para a família da vítima quanto para a família do adolescente?
Para mim, até segunda prova ele é doente, não é criminoso. Talvez ele tivesse apresentado pequenos sintomas e não foi visto, e pessoas leigas realmente não percebem esses sintomas com facilidade. Portanto, ele precisa de tratamento e o que aconteceu foi uma fatalidade. A família do menino deve pensar assim, que foi uma fatalidade e que ele precisa de tratamento. Ele deve ficar recluso pelo tempo que o médico determinar e, quando sair, precisa de acompanhamento. É claro que para a família da vítima não importa se foi uma fatalidade ou não, mas a família do menino deve enxergar assim.
*Marcelo Caixeta é médico especialista em psiquiatria da infância e adolescência pela Universidade de Paris XI , e médico especialista em psiquiatria criminal pela AMB/ABP
Por Mais Goiás