Para especialista, prisão de homem que era CAC reforça necessidade de restrição de acesso a armamentos e munições
O revogaço para desarmar a população, prometido pelo presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva, vai começar por oito decretos e uma portaria. Juntos, os atos editados entre junho de 2019 e fevereiro de 2021 pelo governo do presidente Jair Bolsonaro facilitaram a compra, registro, posse e porte de armas e munições.
A lista dos primeiros decretos para revogação foi indicada pela equipe de transição e está citada no relatório final divulgado pelo vice-presidente eleito Geraldo Alckmin. A anulação desses atos poderá restituir limites para compra de armas que estavam em vigor antes de Bolsonaro tomar posse. Segundo levantamento do Instituto Igarapé, até 2018, a Polícia Federal autorizava que cada pessoa tivesse no máximo duas armas. Os decretos do atual governo primeiro elevaram esse número para quatro e depois para seis.
O futuro ministro da Justiça, Flávio Dino, já havia anunciado a disposição do governo Lula de revogar os decretos de armas de Bolsonaro. O texto produzido pela equipe de transição indicou quais serão os primeiros a serem anulados.
“A proposta é de revogação de oito decretos e uma portaria interministerial que incentivam a multiplicação descontrolada das armas no Brasil, sem fiscalização rigorosa e adequada. O descontrole coloca em risco a segurança das famílias brasileiras e, portanto, deve ser revertido pelo Ministério da Justiça, em diálogo com o Ministério da Defesa”, diz o documento da equipe de transição.
Parte dos atos que serão anulados afeta diretamente os chamados CACs (Colecionares, atiradores profissionais e caçadores). Desde o primeiro ano de gestão, o presidente Bolsonaro assinou decretos que facilitaram não só o registros de pessoas como CACs, como ainda ampliaram o arsenal que essa categoria pode manter em seu poder.
Na véspera do Natal, um CAC, o paraense George Washington de Oliveira Sousa, foi preso depois de tentar praticar um ato terrorista ao instalar uma bomba em um caminhão de combustível próximo ao aeroporto de Brasília. Ele confessou a ideia de “provocar o caos” na capital para impedir a posse de Lula. Registrado como CAC, George tinha transportado para a cidade duas espingardas, um fuzil, dois revólveres, três pistolas, além de centenas de munições e cinco emulsões explosivas.
“Esse caso de Brasília é bastante grave e concretiza o risco que alertamos por quatro anos de que as armas poderiam ter uso político forte e esse caso é emblemático. A facilitação do acesso atingiu pessoas que não tinham o interesse legítimo da prática do esporte, mas apenas queriam se armar para usos não muito republicanos e o acesso a muitas armas é bastante grave”, diz Carolina Ricardo, diretora do Instituto Sou da Paz, entidade especializada em estudos sobre armas.
Levantamento feito pelo Sou da Paz mostra que durante o governo Bolsonaro foram editados pelo menos 40 atos tornando mais fácil o acesso a armamentos e munições. A lista da entidade inclui os decretos que o governo de transição definiu como prioridade para revogação. Segundo Carolina Ricardo, o atual governo não só ampliou o número de armas para cada pessoa com direito a porte ou registro de CAC como reduziu o poder de monitoramento do Estado sobre o arsenal privado. Para ela, é importante fortalecer capacidade de fiscalização, seja do Exército ou da Policia Federal. Os dois órgãos mantêm registros de armas.
Na lista de decretos que serão revogados estão, por exemplo, três editados em junho de 2019 que ampliaram o número de armas para os CACs e liberaram que pessoas físicas passassem a ter até quatro armas em casa – esse número foi ampliado para seis em 2021. O governo petista também quer revogar outro decreto, de 2021, que autorizou o transporte de até duas armas por pessoa detentora de porte de arma.
Por Estadão