Pecuarista é condenado em R$ 300 mil por manter trabalhadores em chiqueiro, sem alimento e sem água

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A Vara do Trabalho de Corumbá (MS) condenou um pecuarista em R$ 300 mil por manter um casal de trabalhadores em condições análogas à escravidão. O homem e a mulher viviam em um chiqueiro e tinham que pagar pela alimentação, mesmo não a recebendo todos os dias e sem receber salário pelos serviços prestados. O casal ainda precisava beber água em um rio próximo, já que não tinham acesso ao recurso.

De acordo com o Ministério Público do Trabalho (MPT), policiais civis e policiais militares do Meio Ambiente flagraram as irregularidades durante uma inspeção no local. Segundo a apuração, o casal foi recrutado e supervisionado pelo empregador e dois filhos dele sem realização de exames admissionais e sem registro em carteira de trabalho. A situação do casal gerou indenização por dano moral e individual.

O MPT pediu R$ 75 mil para o trabalhador, mas o empregador apresentou defesa contestando a indenização solicitada. Ao analisar o caso, a juíza Lilian Cara Isa aceitou parcialmente o pedido. Ela decidiu condenar o réu a pagar indenização de R$ 10 mil ao trabalhador, além de registrar a carteira de trabalho e pagar verbas salariais e rescisórias devidas.

Contexto

Ainda segundo as autoridades, o funcionário trabalhava no rancho havia pouco mais de dois meses, contratado por empreitada pelo valor de R$ 60 por hectare de terra roçada. Entretanto, afirmou nunca ter recebido pagamento e disse que já estava com uma dívida superior a R$ 2 mil com patrão, pela alimentação fornecida durante o período em que o casal permaneceu no local.

Prisioneiros de uma vida insalubre

As condições de habitação na fazenda eram precárias e desumanas. O casal morava em um barracão improvisado, de chão batido, com paredes e telhado feitos de caixas plásticas, madeiras e lonas. Não havia móveis, utensílios básicos e instalações sanitárias adequadas, obrigando-o a fazer suas necessidades no mato. Antes mesmo de habitar no alojamento improvisado, o trabalhador e sua companheira foram menosprezados pelo pecuarista, sujeitos a morar, durante um mês, em um chiqueiro de porcos.

Ainda assim, depois de passar a morar no barracão, consta do relatório da Inspeção do Trabalho que o trânsito dos suínos era livre por todo o alojamento do casal, o que não era muito diferente das condições degradantes em que vivia anteriormente. A água consumida era retirada diretamente do Rio Paraguai, sem tratamento, e o casal, isolado e privado de locomoção, dependia dos patrões para fornecer alimentos, o que nem sempre ocorria, sujeitando-os a doações dos vizinhos para conseguir comer.

“No tocante à tese de trabalho em situação análoga à de escravo, é pacificado no ordenamento jurídico pátrio que referida condição é caracterizada por quaisquer situações a seguir descritas, sejam elas em conjunto ou isoladas: a submissão de trabalhador a trabalhos forçados; a submissão de trabalhador a jornada exaustiva; a sujeição de trabalhador a condições degradantes de trabalho; a restrição da locomoção do trabalhador; a vigilância ostensiva no local de trabalho por parte do empregador ou seu representante, com o fim de retê-lo no local de trabalho; a posse de documentos ou objetos pessoais do trabalhador, por parte do empregador ou seu preposto, com o fim de retê-lo no local de trabalho”, ressaltou a juíza do Trabalho,  Lilian Carla Issa, em trecho da sentença.

16 autos de infração

Depois que o casal foi resgatado, a Inspeção do Trabalho entrou em contato com o proprietário rural. Ele confirmou ser o responsável pela contratação do trabalhador, porém alegou que este lhe realizava “changas”, termo popular que se refere a trabalho temporário. “Carlinhos Boi” declarou que não devia nada ao trabalhador, pois havia levado muitos mantimentos para o casal.

Entretanto, de acordo com o procurador do Trabalho e autor da ação, Hiran Sebastião Meneghelli Filho, o proprietário rural, além de explorar o funcionário de maneira abusiva, descumpriu diversas obrigações trabalhistas previstas na legislação vigente.

“O trabalhador resgatado pela Inspeção do Trabalho não estava registrado em CTPS, não foi submetido a exames médicos admissionais/demissionais e laborava sem que lhe fossem proporcionadas condições de mínima dignidade: sem EPIs, sem alojamento digno, limpo e salubre, sem água potável, sem instalações sanitárias, sem local para preparo e consumo de alimentos, sem lavanderia, sem materiais de primeiros socorros, além de outras irregularidades constatadas”, detalhou Meneghelli Filho.

Dessa maneira, o réu foi condenado à revelia (já que não apresentou defesa) a R$ 300 mil por dano moral coletivo e a R$ 10 mil por dano moral individual, além da obrigatoriedade de cumprir com todos os compromissos legais de sua condição de empregador, sob pena de multa de R$ 3 mil por cada irregularidade, caso haja reincidência no futuro.

Os valores referentes ao dano moral coletivo e às possíveis multas aplicadas serão revertidos a entidades e órgãos públicos ou privados, sem fins lucrativos, indicados pelo Ministério Público do Trabalho, que desenvolvam atividades de interesse público e social, preferencialmente relacionadas direta ou indiretamente ao trabalho.

Com MPT

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